Política Nuclear do Brasil


Economia e Energia – E&E   Nº 101,  outubro a dezembro de 2018
ISSN 1518-2932

Opinião:

UMA POLÍTICA NUCLEAR DE ESTADO
PARA O BRASIL

Carlos Feu Alvim e Olga Mafra

Carlos.feu@ecen.com e olga@ecen.com

Por intermédio de Decreto Presidencial foi oficializada a Política Nuclear Brasileira – PNB, colocando em vigor o texto aprovado pelo Comitê de Desenvolvimento do Programa Nuclear Brasileiro – CDPNB que reúne os principais ministérios da área sob a Coordenação do GSI cujo Ministro-Chefe, General Etchegoyen, assinou o decreto juntamente com o Presidente Temer. Publicado no Diário Oficial de 06/12/2018 como Decreto Nº 9.600, de 05 de dezembro de 2018.

O mecanismo de consenso adotado e o longo processo de elaboração e reflexão iniciado ainda no governo anterior dão ao documento características de Política de Estado. A boa acolhida que ela vem merecendo do Setor Nuclear e a convergência com as diretrizes anunciadas por ministros do novo governo estão completando essa caracterização da política como de Estado.

A Política respondeu de maneira bastante satisfatória a expectativa reiteradamente manifestada nesta Revista sobre sua necessidade. O tom genérico adotado pode não satisfazer as necessidades imediatas, uma vez que se trata das diretrizes que deverão futuramente ser detalhadas, mas reúne, como deve, pontos quase consensuais, com conteúdo abrangente e importantes no estabelecimento das orientações a serem seguidas.

A PNB reafirma o uso pacífico e seguro da energia nuclear e o respeito aos compromissos internacionais nesse sentido. Assinala a importância do domínio do ciclo de combustível e da tecnologia nuclear para o desenvolvimento nacional e para o bem-estar da sociedade. As diretrizes são coerentes com os objetivos mencionados.

As deliberações práticas se concentram, como se espera, na valorização da tecnologia nuclear nas várias áreas em que essa é empregada. Um ponto importante é a definição do propósito de uso da núcleoeletricidade como energia limpa e firme. Fixa, por outro lado, que a responsabilidade de definir a demanda de eletricidade é da Política Energética, cabendo à área Nuclear cuidar da forma de suprir esta demanda.

Fica muito clara a necessidade de capacidade de produção de combustíveis nucleares para atender a demanda interna (o que ainda não vem ocorrendo nem na fase de mineração) e até de atender a uma demanda externa, respeitados critérios de eficiência econômica e preservada as reservas estratégicas cujo montante fica a definir.

A esperada abertura à participação privada na mineração e na produção de radioisótopos não foi institucionalizada, talvez por existirem dúvidas sobre sua factibilidade dentro do quadro constitucional atual. Por outro lado, nada foi feito para reafirmar o monopólio na área e impedir a participação da indústria privada. Também ficou claro na PNB que o limite para as exportações constitui a manutenção de reservas estratégicas o que tornaria permitida a exportação de excedentes.

A agregação de valor no ciclo de combustível é priorizada, a produção deve ser aumentada e atingir o volume necessário para atender as necessidades internas (o que não ocorre atualmente). Esse é um princípio básico a ser perseguido.

A segurança da energia nuclear é enfatizada nos dois sentidos da palavra em português, seja no sentido de lidar com a prevenção e solução de incidentes e acidentes nucleares e radiológicos, como no sentido de oferecer proteção física às instalações nucleares e prevenir tentativas de ataque a elas. Também as salvaguardas, visando a não proliferação nuclear e em favor do desarmamento mundial, são enfatizadas.

A preocupação com a formação e a manutenção no território nacional da capacidade intelectual necessária ao País é explícita e visa conter uma situação preocupante que não é exclusividade da área nuclear.

A conquista e manutenção da tecnologia nuclear em todas as fases do ciclo são reiteradas ao longo de todo o documento. Uma definição importante é a de que será buscado o reaproveitamento do combustível nuclear. Esta é uma decisão da mais alta relevância dentro do ciclo de combustível, que passa a incluir, no longo prazo, o reprocessamento.

Por outro lado, fica claro que a política de armazenamento de combustível será focada em um depósito de longo prazo, mas não definitivo, de maneira a permitir seu reaproveitamento.

Como se vê, embora ainda genérica, em muitos pontos a Política Nuclear Brasileira abre horizontes promissores para o uso racional da energia nuclear no Brasil, definindo completamente seu caráter estratégico.

Nota: A elaboração da PNB deve muito ao empenho do Alte. Wada Noriaki e do Comte. Gleiber Banus. Este último, que coordenou o grupo da SAE/PR no governo anterior foi chamado pelo primeiro ao GSI /PR visando dar continuidade ao esforço realizado anteriormente do qual tivemos a satisfação de participar. Também foram recolhidos subsídios de outros estudos anteriores relativos à política nuclear.

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